“É
preciso desatar os nós antes que eles nos sufoquem” (Luciete Valente)
Banzé e Peteleco, vira-latas danados, sempre escapavam
da carrocinha. Porém, eram inimigos; pois, quando se encontravam era um “Deus nos acuda!”. Latidos... Uivos...
Mordidas... Dentadas... Até que um se rendia.
Agosto, mês de cachorro louco e de complicações. Foi
nessa época, que foram surpreendidos e levados ao abrigo municipal, amarrados
um ao outro por cordas, com uma forte laçada nas pontas.
Constantemente se pegavam até um tirar sangue do
outro. Era mordida de um lado, dentada de outro, até que engalfinhados caíram
no açude do canil. E para desespero de ambos o nó da corda molhada mais ainda
se acirrava.
O tempo foi passando e os dois se matando em constante
luta corporal.
Num dos momentos de descanso de renhida luta, ficaram
surpresos de ver o velho cachorrão Merlin discursando para uma grande platéia.
Aproximaram. Admirados, ouviram a “voz” da experiência daquele velho guerreiro, muito festejado por
latidos das mais diferentes tonalidades.
Banzé e Peteleco chegaram bem perto daquele forte “latido de sabedoria”, que ecoava longe.
E Peteleco, tomando a iniciativa, perguntou:
- Mestre Merlin, eu e meu inimigo estamos presos um ao
outro e por isso não podemos fugir. Quanto mais tentamos mais o nó da corda
aperta! Quando lutamos o nó aperta ainda mais! E quando a corda está molhada é
pior ainda! Nossa vida é um inferno e não vemos qualquer perspectiva de futuro!
- Bem!... Sabe!... - Respondeu Merlin, em repetidos bocejos e coçando o
queijo com a pata dianteira. Deixa ver!...
E, depois de um momento de reflexão, filosofando
murmurou:
- Hum!... Será que vocês estão sob a lei da matéria?
- Como assim? - Perguntaram ambos, em uníssono, cheios de dúvidas.
- Já ouviram falar em “olho por olho e dente por dente”?! Isto é, quanto mais um fere o
outro, mais ferido fica! É o batismo da água! E quem não passar pelo batismo da
água e do fogo nunca terá liberdade!
- Eu já ouvi falar de gasolina batizada - disse Banzé.- mas..., água?
- Procurem saber, então, - disse Merlin - sem isso nada feito.
Dito isso, o velho cão continuou sua jornada de
aconselhamentos.
Banzé e Peteleco, a partir desse episódio, tomaram
difíceis resoluções: fim das contendas pra ver se o nó da corda se afrouxava; e
diálogo constante para a solução dos problemas comuns. Foi assim que, na festa
junina do canil, ao se aproximar da fogueira, perceberam que a corda havia
secado e o nó se afrouxara. Com jeito e muita calma, então, se desvencilharam das
amarras.
Livres um do outro, e já meio “humanizados”, continuaram a viver no canil com o intuito de
orientarem os outros a respeitarem seus companheiros.
Esta mudança de atitude foi notada. Enfim a liberdade!
Adotados por nobres famílias vivem cheios de felicidade. De vez em quando as
famílias se visitam para que eles possam agora se ver como amigos e matar a
saudade.
Moral da história: No mundo em que vivemos estamos, talvez por força do destino, sempre
atrelados a pessoas que atribuímos ser de difícil convivência. E, o mesmo ela
pensa da gente!
Que tal a gente tomar coragem para desatar os nós que
amarram nossas vidas, para não vivermos sufocados!
Desatar as amarras é deixar de lado as farpas
trocadas, as mesquinharias, os maus hábitos e principalmente tudo que causa
arrogância: altivez, insolência, orgulho, presunção, empáfia, soberba...
A finalidade cósmica do atrelamento humano é aparar
arestas da pedra bruta – que somos! –, até a lapidação completa. Para, reluzentes,
podermos comparecer perante a espiritualidade maior.
Nas famílias acorrentam-se os inimigos de priscas
eras. Se a animosidade é maior entre eles, mais se apertam os elos da corrente.
É a lei da matéria em funcionamento: “quem
com ferro fere com ferro será ferido”.
Jesus, entretanto, deixou para a humanidade a lei da
espiritualidade: o mandamento do amor ao próximo, o batismo de fogo. Porque o
Amor é como o sol que nasce para todos, que ilumina, acalenta, perdoa e que,
enfim, liberta, porque afrouxa os elos da corrente, desatando as amarras.
Só pelo Amor se encontra a paz e a felicidade que
tanto se almeja!
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