Aquecendo a Vida

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quarta-feira, 20 de maio de 2015

A VERGONHA

“Quando a parede racha, não adianta tentar consertá-la, a fenda permanece”. (Ghandi).



Eis o noticiário diário da tevê: crise, grampos, irregularidades, ilegalidades, fraudes, casos de negociatas, “cartas marcadas” em licitações, “laranjas”, empresas de fachadas, lavagem de dinheiro, corrupção, máfias, paraíso fiscal, maracutaias, furtos, ladroagem, tráfico, contrabando, drogas, sonegação, nepotismo, propinas, escândalo dos bingos, dólares na cueca, mensalão, mensalinho, operação Lava Jato, escândalo da Petrobrás, CPI, invasões de propriedade, “golpismo”, etc.
Diante de tanta lama, me incorpora a indignação de Rui Barbosa – “a Águia de Haia” –: “De tanto ver triunfar a nulidade; de tanto ver prosperar a desonra; de tanto ver crescer a injustiça; de tanto ver agigantar-se os poderes nas mãos dos maus; o homem chega a desanimar-se da virtude; a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto”.
A vergonha é um sentimento de angústia, de humilhação e remorso, de dor intensa na alma, quando temos a percepção de ter feito algo errado.
Judas, quando percebeu o erro de sua traição, de vergonha se suicidou. Será que os nossos governantes e os representantes do povo se sentem envergonhados por todos esses escândalos?
Parece que não! A maioria nem sabe o que é sentir vergonha! E pela falta do senso de vergonha vão se perder com os escândalos e outras sem-vergonhices!
“Meter em brios” era o modo de meu saudoso pai me chacoalhar para agir com dignidade e zelar pela própria reputação. Era um “puxão de orelha” para me mostrar que a falta de brio leva à desonra, à humilhação, ao ridículo. Quem tem brios tem vergonha na cara! – dizia-me ele. Então aprendi que sentir vergonha é uma questão de formação do ser humano.
E a sem-vergonhice como é que fica?
Que me perdoe o Rui, mas não quero me desanimar da virtude! Na vida, a virtude é fundamental! E vou responder essa questão valendo-me de um conto polonês sobre UMA FESTA NO CÉU.
Certo dia, o Criador lembrou-se de festejar todas as virtudes nos seus palácios azuis. Mas, Ele só convidou as damas, os cavalheiros não.
Compareceu então um grande número delas. As pequenas virtudes eram mais afáveis e corteses do que as grandes, mas todas conversavam amavelmente, como deve acontecer entre pessoas íntimas e aparentadas.
Em dado momento, o Eterno notou duas belas damas que pareciam desconhecidas uma da outra. Levou uma na presença da outra e disse:
– Apresento-lhe a Beneficência, disse Ele, designando a primeira; apresento-lhe a Gratidão, ajuntou, indicando a outra.
As duas virtudes ficaram pasmadas, pois desde que o mundo é mundo, era a primeira vez que se encontravam.
Encerrada a festa, a orquestra Angélica entoou belíssima harmonia e as convidadas respeitosamente despediram-se, repetindo seus nomes e oferecendo suas residências.
Assim, a declarou que sua morada era nas almas grandes e nos corações firmes; a Caridade disse que vivia no seio das pessoas praticantes da Beneficência: sua irmã gêmea; a Honra indicou sua moradia no peito dos bravos, no coração das virgens, na fronte dos homens de bem e das mulheres honestas; a Esperança declarou ser encontrada em todos os lugares onde não houvesse passado seu pior inimigo: o Desengano; a Abnegação declarou residir onde não houvesse o Interesse; a Consciência disse que morava juntamente com a ... Deste modo, cada virtude foi fazendo sua despedida, declarando aonde podia ser encontrada.
Entretanto, uma virtude sem resolver sair, estava triste, cabisbaixa, sentada a um canto, com os olhos banhados em lágrimas! Era a Vergonha.
Penalizada, a Honra aproximou-se dela e perguntou-lhe:
– Por que está assim? A festa já terminou e é preciso que as convidadas se retirem. Abraça-me e dize-me onde a posso encontrar.

– Eis aí a razão do meu abatimento e da minha tristeza – respondeu a Vergonha. – As minhas amigas, quando se separaram, designaram suas moradas, ao passo que eu, com profundo pesar, só lhes posso dizer o seguinte: quem me perder uma vez, nunca mais me encontrará!

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